Big Spring, Texas
Por Flavia Vieira
Mais de 30 anos atras, quando o primeiro Campeonato Mundial de Asa Delta aconteceu, as provas consistiam em permanência e pouso de precisão, nem mapas eram necessários. Desde la são incontáveis as mudanças e o desenvolvimento pelo qual nosso esporte passou.
Quem imaginaria, em 1976 , no alto daquela montanha na Áustria, no primeiro campeonato Mundial sancionado pela FAI, que na décima sexta edição daquele Campeonato mais de cem pilotos estariam decolando do chão, puxados por ultraleves especialmente desenvolvidos para reboca-los.
Quem imaginaria, mesmo em 1981, em Beppu, no Japão, onde o nosso Pepê foi campeão, que os pilotos, na décima sexta edição daquele Campeonato, estariam usando um sistema de navegação via satélite e que estariam voando mais de 280km de distancia em velocidades que superam 100km/h.
Este mundial do Texas mostrou, sem sombra de duvidas, todos os frutos dessa evolução. Além do que ha de mais inovador em termos de asas e instrumentos, a organização e o comitê de prova lançaram mão de todo o sistema oficial Americano de rastreamento e informação sobre clima e tempo para a escolha das provas. Informações tais como altura das nuvens e temperatura na base, intensidade de térmicas e de vento, oferecendo uma analise detalhada e bem precisa da condição, a cada dia, poucas horas antes da janela de decolagem.
Ultrapassando os avanços tecnológicos, uma das razões para o sucesso do Mundial do Texas foi o cuidado logístico na realizacao do evento. Mesmo usando um sistema nao tradicional de competicao – o primeiro Campeonato Mundial a utilizar reboque aereo como decolagem foi na Australia em 2005 – a organizacao mostrou que nos Estados Unidos ja existe uma tradicao em campeonatos de reboque. A experiencia adquirida nos inumeros “fly parks” americanos e em todos os anos do Flytec Championship, garantiu uma equipe de pilotos de Dragonfly e de tecnicos de decolagem extremamente experiente. Soma-se isso ao proprio desenvolvimento dos Dragonflies, dos sistemas de relese e da construcao dos “dollies” (carrinhos) e o resultado foi uma competicao de alto nivel e sem acidentes.
Com toda essa estrutura, restou aos melhores pilotos, vindos de 26 nacoes distintas, mostrarem a evolucao do potencial humano no voo livre. E assim o fizeram: mesmo com condicoes dificeis nos 3 primeiros dias, em ceu azul, vento forte e termicas fracas, os pilotos voaram provas de 140, 180 e 170km, com uma media de 40 pilotos no goal. Já entao se definiam os pilotos que brigariam pelo titulo de Campeao do Mundo: o hungaro Atila Bertok – que venceu as tres primeiras provas, e os austriacos Gerolf Henrichs e Robert Resinger.
No quarto dia as condicoes melhoram, as nuvens finalmente aparecem no ceu e a prova de 150km trouxe 92 pilotos ao goal. O australiano David Seib foi o mais rapido do dia, quebrando a invencibilidade de Atila na competicao.
A quinta prova fez jus a fama do texas e foi uma das mais longas da historia: 285km. Condicao classica: Cloudstreets por toda a parte, termicas fortes e abundantes e teto de 3.000m do chao. Sessenta pilotos chegaram ao goal, alguns ainda estavam no ar as sete da noite e muitos quebraram seus recordes pessoais. O grande vencedor do dia foi o frances Mario Alonzi, recordista sul americano de distancia (432km no Ceara em 2000), que realizou o percurso em 4:15min. O brasileiro Nene Rotor mostrou uma das melhores performances nessa prova e chegou em quinto, apenas tres minutos atras de Mario. O ultimo piloto no goal voou durante cinco horas e meia e pousou quase oito horas da noite. Um dia memorável!
Depois da longa prova a organizacao optou por um dia merecido de descanso e no setimo dia as condicoes voltaram a ficar instaveis devido a aproximacao de uma tempestade tropical no Golfo do Mexico. A comissao define uma prova de 165km, mas ninguem completa. O piloto Checo Dan Vihnalik voou mais longe, pousando na marca dos 147km, a piloto alema Corinna Schwiegershausen, unica mulher neste Mundial, teve o quinto melhor voo do dia (141km) e a grande maioria dos pilotos pousou na marca dos 120km. Nada mal para a condicao considerada a mais fraca neste Mundial.
O oitavo dia foi surpreendente! Pelas condicoes do dia anterior e a neblina que estava presente desde cedo, poucos achavam que a prova de 172km seria fácil de realizar. Feliz engano. Esta foi uma das provas mais rápidas do campeonato. A média de velocidade dos pilotos do primeiro pelotão foi de 80km/h. O primeiro start foi as 2:20 e as 5:00 da tarde já haviam 40 pilotos no goal. No total foram 76 no goal e um destaque brasileiro; André Wolf chega em segundo, atras apenas do austríaco Robert Resinger, que depois dessa vitoria encostou no lider, Atila, por uma diferenca de apenas 16 pontos.
A condicao pre frontal que causou o sucesso da setima prova, trouxe no nono dia muita chuva e ate alagamentos em algumas areas da pequena cidade de Big Spring. A chuva cessou no decimo e ultimo dia de competicao, mas o teto baixo e o vento forte fez com que os organizadores optassem pelo cancelamento da prova. Ainda assim, aprovitaram que não estava chovendo e fizeram um campeonato de pouso na mosca, aberto a todos, ate mesmo aos resgates e membros da organizacao. Davis Straub (o guru do Oz Report), Bobby Bailey (o pai do Dragonfly) e David Glover (organizador do evento) participaram da brincadeira e não deram vexame, ficaram bem perto do alvo, mas ninguem teve chances contra a destreza dos pousos perfeitos do australiano Johnny Durand, que levou pra casa 500 dolares, premio doado pela maior refinaria de petroleo da regiao.
Assim, num clima de camaradagem e descontracao, terminava a decima sexta edicao do Campeonato Mundial. Atila Bertok, um dos mais experientes e respeitados pilotos do mundo, se fez campeao numa competicao acirrada com os maiores nomes do voo livre mundial. Em seu discurso emocionado, na cerimonia de encerramento, mostrou a grandeza de um campeao e o verdadeiro espirito de um esportista, agradecendo a participacao de todos os pilotos presentes nesse Mundial, que deram o melhor de si e fizeram dessa competicao um marco pro esporte. Lembrou da ausencia do Campeao Mundial Oleg Bondarchuck, que se recupera de um acidente e de nomes que sempre o inspiraram, como o do tri campeao mundial Tomas Suchaneck.
Apesar de toda a tecnologia, modernizacao e desenvolvimento que hoje nos distanciam daquele primeiro Mundial de 76, esta o espirito de superacao, que nos une novamente aqueles pilotos pioneiros do nosso esporte, pelo puro prazer de voar cada vez mais e melhor.
Links para os resultados:
individual
equipes
Aqui vao algumas fotos:
Fila de decolagem no aeroporto de Big Spring
Foto: Tim Meaney
O piloto australiano Craig Coomber, setimo colocado nesse mundial.
Foto: Tim Meaney
Placa do Campeonato Mundial no Hangar principal do aeroporto de Big Spring
foto: Flavia Vieira
Davis Straub, o diretor de provas, analiza as condicoes do dia e passa informacoes sobre a prova
foto: Flavia Vieira
Comissao de prova: O frances Mario Alonzi, o hungaro Atila Bertok e o austriaco Gerolf Henrichs
foto: Flavia Vieira
Bobby Bailey, o inventor do Dragonfly, voando baixo
foto: Tim Meaney
Corina Schwiegershausen, o melhor resultado feminino da historia de um Mundial, decima quarta colocada.
Fotos: Flavia Vieira
Dragonflies brincam depois de finalizados os reboques.
Foto: Tim Meaney
Bela corrigida do piloto Japones Koji Damon
foto: Tim Meaney
Luizinho Niemeyer, levando o dolly na decolagem
foto: Tim Meaney
Gra Bretanha, a equipe campea do Mundo. Sem grandes estrelas individuais, a equipe inglesa mostrou que a receita para vencer e consistencia: ter todos os pilotos da equipe no goal, todos os dias
foto: Flavia Vieira
A Equipe da Franca, segunda colocada, sempre um dos times mais organizados.
foto: Flavia Vieira
O time da Austria, terceira melhor equipe neste Mundial
foto: Flavia Vieira
O pouso perfeito de Johnny Durand Jr.
foto: Flavia Vieira
Os campeoes individuais: Atila, Robert e Gerolf.
foto: Flavia Vieira